sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Veja como evitar as roubadas no estágio

Para aprender é preciso ter paciência, pois nem todo programa ensina

Já imaginou entrar num programa de estágio para trocar o lixo do escritório? Ou quem sabe para comprar cigarros para seu chefe? Parece inacreditável, mas muitos estudantes passam por situações humilhantes quando na verdade buscam oportunidades de aprender na prática aquilo que viam na Universidade. É claro que essas atividades são tão dignas quanto quaisquer outras, mas é igualmente evidente que nenhum estudante universitário tem como meta de estágio servir café, ou atender pedidos de profissionais que nem fazem parte do seu departamento. Quem está na universidade certamente tem o objetivo de ingressar num estágio para iniciar a vida profissional. Quer colocar em prática todo conteúdo visto durante a graduação e encontrar profissionais experientes que possam ensinar. Porém, nem todo estudante tem a sorte de encontrar uma empresa que proporcione este conjunto.

A estudante e estagiária de Recursos Humanos, Michelle Nunes Vieira, 19 anos, reconhece que no mundo real do estágio é preciso ter paciência como aliada para conseguir atingir o objetivo principal: aprender. "No começo do programa fazia café, trocava o lixo, buscava correspondência pessoal e depositava cheques. Sentia-me avacalhada", diz a aprendiz, que está há seis meses na empresa. No entanto, o fim da humilhação só veio quando Michelle resolveu se impor. Por causa do aumento do volume de trabalho, a estudante percebeu que os "favores", além de inconvenientes, atrapalhariam a sua função primária no estágio. "Depois deste período, me posicionei e não aceito os pedidos. Hoje faço as atividades que correspondem ao meu estudo", garante ela.

Michelle Nunes Vieira, 19 anos, afirma ser preciso ter paciência no estágio

Embora a estudante tenha aceitado os serviços, a coordenadora de estágios da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), Simone Tavit, explica que o objetivo do estágio é aprender na prática o que se vê na teoria. Algo que ficará mais claro ainda com a nova lei de estágio. "O objetivo do estágio é gerar aprendizado, colocar o estudante em contato com profissionais e com novas responsabilidades. Além disso, proporcionar crescimento pessoal", explica Simone. Ao contrário do argumento da coordenadora, Michelle diz que não sente que possui o direito de aprender. "A responsabilidade que tenho é de algo que não poderia ter. Não faço as funções prometidas e sinto que não posso errar", revela a estudante.

A universitária do 5º ano de Direito, Paula Pires do Prado, 22 anos, já passou por experiência similar a de Michelle num programa de estágio de que participou. Entretanto, precisou ficar dois anos comprando cigarros para a ex-chefe até conseguir outra oportunidade. "Estava mais limitada porque estudava de manhã e não havia muitas ofertas para mim. Por medo de ser demitida aceitei. Além do cigarro, pagava contas pessoais no banco", lembra ela. Embora Paula tenha desenvolvido atividades que não tinham nenhuma relação com a graduação que fazia, a estudante acredita que a experiência foi válida. "Nem todo profissional tem paciência de ensinar tudo. Fui atrás e pesquisei porque tinha assuntos que não havia visto na faculdade", diz Paula, que afirma que o primeiro estágio contribuiu para o próximo. "Ganhei agilidade e já estava inserida no assunto. Desta vez, minha chefe ajudou bastante e tive apoio para aprender coisas novas e ganhar mais autonomia nas atividades", declara.

De acordo com a coordenadora de estágios da FAAP, não é errado aceitar um trabalho que não tenha a ver com o curso do estudante, porém, as principais tarefas devem estar ligadas à graduação. "Quando o estagiário começa a trabalhar, faz um pouco de tudo. Entretanto, cabe a ele analisar e ver se aprenderá alguma coisa. Um acordo com o superior e uma análise do que está previsto no contrato, podem esclarecer dúvidas", sugere Simone. O mais importante para o estagiário, na opinião dela, é ter o espírito para fazer o melhor. "O estudante não pode aceitar só tarefas básicas como tirar cópias e furar folhas. Porém, é bom mostrar cuidado com a empresa e vontade de servir", diz a coordenadora, que aconselha o estudante a deixar o estágio se o interesse da empresa for só esse.

Ainda que alguns estagiários tenham de passar por atividades que considerem desagradáveis antes de ingressar na área que realmente pretendam, existem empresas que possuem planejamento estruturado para atender os jovens. A analista de recursos humanos da Basf, Joana Rudiger, explica que além de vivenciarem o trabalho, os estudantes têm cada atividade acompanhada pelos superiores. "A função da organização é desenvolver, motivar, treinar e observar o estagiário. Para isso, tudo é supervisionado pelo superior", diz. Joana assegura que na empresa, que possui aproximadamente 300 estagiários no Brasil, o trabalho é intenso e não há transição do simples para o complexo. "A evolução não parte deste princípio. Os estudantes já começam acompanhando o mais complicado até fazer sozinhos", explica Joana.

E planejar com profissionalismo e metodologia é algo que pode render bons frutos para as empresas. Que o diga a gerente de recursos humanos da Bosch, Vera Gobetti. Segundo ela, a partir de um plano estruturado de estágio, a empresa chega a efetivar metade dos seus estagiários. "Encaramos o estagiário como um profissional em desenvolvimento, mas que gera trabalho para a empresa e precisa contribuir", afirma ela. Entretanto, Vera faz um alerta quanto às responsabilidades que o aprendiz deve ter. "O volume de atividades do estudante não pode ser o mesmo de um profissional formado. Os conhecimentos e a experiência mudam e tudo deve ser proporcional", declara a gerente, que garante que o trabalho na prática é a função principal do estagiário. "Tem muito trabalho para fazer e muitos não têm tempo de olhar algo pessoal durante o dia. Todas as atividades são compatíveis com a maturidade de cada um", assegura Vera.

Paula Pires do Prado chegou a ter de comprar cigarros para o chefe antes de conseguir uma oportunidade

Prestes a se formar em direito, a estudante Paula Pires do Prado, já considera suas atividades semelhantes à de uma profissional. "Faz quatro anos que estou como estagiária e sempre mostrei que não estava restrita a serviços pequenos. Hoje, sou cobrada como profissional, tenho trabalhos maiores e mais complexos", orgulha-se. Na visão da analista de recursos humanos da Basf, Joana Rudiger, o comprometimento é importante para o desenvolvimento do estagiário e também para o gestor notar o interesse do candidato, de maneira que faça com que ele evolua. "A imersão no trabalho real gera bom contágio dos demais funcionários. Deste modo, o estudante ganha a destaque", explica.

Retorno da empresa

Pelo menos a cada seis meses, o estagiário deve ser avaliado para saber como anda o desenvolvimento do seu trabalho. O conselho da coordenadora de estágios da FAAP vale para qualquer empresa, independentemente do tamanho. "O estudante precisa render e gerar resultados, para isso alguém deve responder sobre suas atividades", afirma Simone. Além da preocupação de transferir conhecimentos ao estudante, a gerente de recursos humanos da Bosch se reúne a cada dois meses com os estagiários para avaliar o aprendizado deles. "O estudante passa por um processo dividido em etapas. O gestor responsável observa as principais necessidades e, se precisar, o estagiário pode visitar outras unidades, apresentar um trabalho específico ou um relatório", diz a gerente que garante que o estudante não é um faz-tudo. "O universitário chega a coordenar uma área de trabalho feita por uma consultoria terceirizada, por exemplo, daí vem a importância da avaliação dele", explica Vera.

Além das avaliações semestrais, a analista Joana conta que na Basf os estagiários são expostos a programas de integração e contato com outros profissionais e gestores. "Todos os estudantes são treinados e se reúnem para assistir palestras, participar de gincanas e conhecer outros departamentos. Essas atividades geram motivação e permitem que eles se destaquem", conta Joana.

De acordo com Simone, ser avaliado é essencial para o estudante se posicionar na função, porém, esse processo de avaliação varia de empresa para empresa. Na opinião de dela, o estágio numa companhia de grande porte permite maior estrutura. "Geralmente elas têm um plano de estágio com atividades detalhadas e benefícios", resume ela. Entretanto, devido ao número reduzido de funcionários, o contato com diversas áreas será comum na empresa de pequeno porte. "Os universos são diferentes. Numa companhia menor, o estagiário terá de fazer de tudo um pouco. Contudo, o retorno do trabalho será mais direto e o jogo de cintura será maior", acredita Simone. Embora haja vantagem em ambas as empresas, Simone ressalta que independente do tamanho da organização, o estudante precisa de bagagem. "O aluno que se forma sem o estágio perde muito. Ele precisa encarar e começar o trabalho. O mercado é cruel e exige a formação na prática", alerta.

Fonte: Universia

Postado: Simone Santos


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